
Whitney Loverly parece ter tudo o que uma mulher poderia querer: é bem-sucedida, mora na casa dos sonhos, tem um marido apaixonado e é mãe de três filhos. Mas, durante um churrasco que reúne os vizinhos, Whitney coloca tudo a perder ao se exceder com o filho mais velho, Xavier. Todos os convidados escutam os gritos da anfitriã, que vê uma enorme rachadura riscar a fachada de sua “vida perfeita”.
Dias mais tarde, Xavier sofre um acidente que o deixa entre a vida e a morte. Whitney decide não deixar o leito do filho inconsciente e se recusa a falar sobre o que aconteceu. Ao mesmo tempo, acompanhamos Blair, Rebecca e Mara, vizinhas de Whitney que travam suas próprias batalhas dentro da maternidade e de seus casamentos e estão, direta ou indiretamente, conectadas à noite do acidente.
Como muitos leitores, conheci Ashley Audrain por O Impulso, um thriller eletrizante que traz ótimas reflexões e questionamentos sobre maternidade. Por isso, confesso que foi impossível conter as altas expectativas sobre Os Sussurros. E, infelizmente, o livro não foi exatamente o que eu esperava.
Não me entendam mal: mais uma vez, a autora expõe com perfeição as angústias e dificuldades que a maternidade traz – e agora posso falar com propriedade. Os Sussurros expõe a sobrecarga materna, assim como a culpa que parece ser intrínseca ao papel da mãe, mas não ao do pai. Fala sobre a dificuldade de voltarmos a nos enxergar como indivíduos depois que dividimos o corpo com outro ser humano. E ainda externa sentimentos e questionamentos que muitas escondem e silenciam por não serem o que a sociedade, que tanto julga as mães, considera adequados.
Ainda assim, senti que Audrain acabou reforçando estereótipos perigosos. Whitney, por exemplo, é uma mulher que não se identifica com a maternidade. E me incomodou bastante o fato de que a autora a construiu justamente para não ser uma boa mãe (ao menos para Xavier). Como se uma mulher que não é a figura da “mãe perfeita” que vive no imaginário coletivo não pudesse desempenhar bem o seu papel e ser amorosa com seus filhos.
Já Blair ama ser mãe e é alvo de inveja de Whitney justamente por ser tão boa com Chloe, sua filha. No entanto, ela se sente uma “não-pessoa”, como se seu verdadeiro eu tivesse sido engolido pela maternidade. E por mais que eu saiba que muitas mulheres se sentem assim (eu mesma já me senti), não entendo por que Audrain escolheu construir Blair dessa forma. Será que uma mãe em tempo integral, e que é feliz nesse papel, necessariamente se sente ou é anulada como pessoa?
Outro aspecto que me incomodou em Os Sussurros foi a quantidade de cenas gráficas. As sexuais, eu achei exageradas na quantidade, mas não dei muita atenção. Já as que envolviam aborto realmente me incomodaram, pois me pareceram sem propósito, apenas uma forma de explorar o sofrimento de uma personagem, que é também o sofrimento de muitas mulheres da vida real
Então, por mais que Os Sussurros traga muito da realidade materna e aborde questões que precisam ser mais discutidas, a leitura realmente não foi o que eu esperava – e acho que, nesse caso, as expectativas não foram as culpadas. Para completar, achei que o desfecho também deixou a desejar: ao longo da história, Audrain desenvolve diversas subtramas que acabaram abandonadas no final. Uma pena, pois tinha potencial!
Título original: The Whispers
Editora: Paralela
Autora: Ashley Audrain
Tradução: Lígia Azevedo
Publicação original: 2023