Resenha de As pequenas chances – Natalia Timerman

Era uma tarde de um sábado qualquer, sugeri conhecermos a Livraria Cabeceira. Já na entrada, as cores de As Pequenas Chances me chamaram. Só depois percebi se tratar de uma obra de Natalia Timerman, autora que eu já queria conhecer. Não tenho o costume de ler sinopses, mas aquela eu li e me deparei com parte da minha própria história: a de uma filha que perdeu o pai após o diagnóstico de câncer.

As Pequenas Chances é uma obra de ficção que flerta – muito – com a realidade. E não seria, então, uma analogia e uma inversão da própria dor da perda? Afinal, o luto é uma obra da realidade reescrita pela ficção que criamos do passado, do presente e do futuro para lidar com a ausência de quem amamos. Apesar de ter vivido muito do que narra a 1ª parte, não me conectei como esperava. Já na 2ª e na reta final, “conexão” fica aquém do que senti. Acompanhar o pai durante o tratamento fragmentou Natalia da mesma forma que me desfez. Mas se engana quem pensa que nos transformamos apenas em pedaços que doíam. Não, eram fragmentos de inesperada gratidão e, acima de tudo, de amor, que nos mantiveram e mantêm inteiras da forma que é possível.

Eu poderia falar sobre as difíceis experiências que Artur, o pai de Natalia, e Fernando, o meu pai, compartilharam já em cuidados paliativos. Ou de como me vi nas dores e reflexões que o luto trouxe à protagonista. Mas gostaria de falar sobre as enormes chances que a vida, beirando à morte, me deu. A 1ª foi a coragem, a urgência de falar o que eu gostaria que meu pai soubesse sobre mim e sobre nós. A 2ª foi o encontro dele com meu filho.

Eu passei quase toda a gravidez pedindo saúde para o meu menino e força para o meu pai, para que eles pudessem se encontrar diante de mim. E quando vi o Julian nos braços que também me carregaram, o amor que pairava entre eles abriu uma fenda, no tempo, no espaço e em mim, onde não havia doença, dor ou frustração. Só havia a felicidade por ver e viver aquela cena. Talvez seja difícil entender como aquele momento, tão diferente do ideal, pode ter sido tão perfeito. Mas é que eu já conhecia as chances que não têm a chance de ser. E sabia que a perfeição mora naquelas que temos a simples chance de viver.

Editora: Todavia
Autora: Natália Timerman
Publicação original: 2023

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