Dizem que três é o número do equilíbrio, da união e da perfeição. Para Nina, Adrien e Etiènne, três também é inteireza, unidade e inerência. Entre suas faltas, sobras, afetos, sonhos, verdades, mentiras e perdas, os três de Valérie Perrin se encontram, se conectam e se fundem. Ainda assim, nem sempre são equilíbrio e união. E definitivamente, não são perfeição. Mas, de formas tortas, se completam porque se compreendem onde mais dói – os buracos que não podem ser tapados.

Em Três, a autora de Água fresca para as flores passeia entre passado e presente para dissecar as vidas para sempre entrelaçadas de Nina, Adrien e Etiènne. Com naturalidade e fluidez, Perrin nos presenteia com tudo o que compõe a complexidade dos protagonistas: os gostos, os desgostos, a voz, o cheiro, o toque, a percepção de si mesmos, os desejos, as fraquezas, as virtudes, os medos… E assim nos transforma em todos os que não são Nina, Adrien e Etiènne. Mas, às vezes, também nos faz sentir que somos os três, juntos e separados.

Luto, abandono e negligência parentais, abuso psicológico e não pertencimento são alguns dos temas tratados em Três – e ainda há outros que prefiro não citar para não revelar demais. A tudo isso, Perrin ainda adiciona inesperadas camadas de mistério que, após um início lento, nos envolvem cada vez mais.

E se em Água fresca para as flores, senti que a autora se demora um pouco mais do que deveria em alguns trechos, em Três foi o oposto. Embora não deixe pontas realmente soltas, a trama tem um desfecho rápido demais – ou será que era só a minha saudade de Nina, Adrien e Etiènne já se manifestando?

Poderíamos dizer que Três é um romance sobre amizade, mas seria simplório demais. Três é a prova de que aquilo que nos é caro pode ser tão inquebrável quanto frágil. É o lembrete de que a vida e o tempo levam, mas também dão, devolvem e ressignificam. Três é uma história de vida – sim, no singular. Porque não se trata da história de três vidas e, sim, de três vidas que contam uma só história.

Título original: Trois
Editora: Intrínseca
Autora: Valérie Perrin
Tradução: Julia Sobral Campos
Publicação original: 2021